quarta-feira, 31 de agosto de 2016

Abuso de poder religioso é crime eleitoral


O abuso do poder religioso, é equiparado pela  lei eleitoral  a outras formas de abuso de poder, quais sejam, o econômico, o político, o ideológico, o da informação e o da autoridade, e sujeito a aplicação das mesmas normas de repressão para as demais formas já previstas.

Quando o assunto é abuso do poder, tema tão caro e imprescindível à democracia e à liberdade do voto, temos um cenário novo para discutir: o abuso do poder religioso e o assédio moral aos fiéis, que tem agitado a reflexão da sociedade sobre a necessidade de revisão da legislação eleitoral vigente. 

Já são conhecidas algumas formas de abuso de poder, quais sejam, o econômico, o político, o ideológico, o da informação e o da autoridade. Mas o poder religioso é novidade das mais recentes eleições. Não só porque passa por cima das leis humanas e das leis de Deus, mas devidos aos meios e artifícios utilizados pelas lideranças políticas, tudo com o indigesto aval das lideranças religiosas.

As condutas vão desde o registro de números de candidaturas de fácil vinculação com números bíblicos, arregimentação de discípulos de células como cabos eleitorais, pedidos de votos na porta das igrejas até os apelos mais emocionais possíveis no altar, durante os cultos de celebração, com uma suposta base equivocada na Palavra de Deus.

É certo que a religião tem o seu poder positivo, de transformar pessoas que buscam cura na alma, estimulando comportamentos que colaboram com a paz na sociedade. É igualmente imprescindível o seu papel de conscientização social, orientando os fiéis na escolha de candidatos que possam contribuir com o aperfeiçoamento da sociedade.

Como em qualquer outro local, o ambiente religioso é também construído socialmente e o cristão, onde quer que esteja atuando deve atuar em conformidade com os preceitos bíblicos. Isso vale para o lar, para os amigos, para a profissão e para a política.

Agora, inaceitável que, como as demais formas espúrias de poder e dominação, o poder religioso venha a atrair aqueles que queiram transformá-lo em um trampolim político, merecendo tal conduta não só a repressão legal da justiça eleitoral, como a repressão interna das autoridades religiosas.

Se é verdade que por meio das eleições os cristãos almejam uma mobilização que faça revigorar valores perdidos na sociedade, cuja ausência tem culminado com o aumento da violência, também se pode afirmar que esses mesmos cristãos devem ser exemplo a partir de seus atos políticos, seguindo o caminho mais correto possível.

Nessas eleições, encontram-se dois casos paradigmáticos sobre a ética cristã. O primeiro caso ocorre quando um candidato, sendo evangélico, abre mão de utilizar essa situação para a disputa, deixando a liberdade de escolha aos fiéis que conhecem seus planos e programas de trabalho. O segundo caso ocorre quando outro candidato faz justamente o contrário, usando argumento de ser evangélico para arregimentar os eleitores por meio de práticas totalmente desaconselhadas pela Bíblia.

Na segunda hipótese, fica mais do que configurado o abuso do poder religioso, o que, ante o silêncio da lei eleitoral nesta parte, autoriza a aplicação das mesmas normas de repressão para as demais formas já previstas.

A Convenção Batista Nacional da Paraíba (CBN-PB), emitiu nota para repudiar qualquer tipo de propaganda, nos púlpitos das igrejas evangélicas, por parte dos líderes e pastores.

A Convenção entende que o uso político dos púlpitos é um desrespeito à legitimidade do culto e à lei eleitoral, que proíbe manifestação política nos templos religiosos.

A nota emite o seguinte texto:

“A CBN-PB entende que é impossível ser apolítico e que o querer ser é de certa forma um sinal de ignorância e alienação. Portanto, somos políticos no sentido mais amplo da etimologia da palavra e louvamos a Deus pela liberdade que a Democracia nos confere de exercermos a nossa cidadania e lutarmos por um país melhor através de um dos instrumentos democrático, o voto.

Entretanto, ao que se refere a propaganda eleitoral dentro dos templos e, mais escancaradamente, na hora de culto, feita por muitos líderes evangélicos, sendo o recinto lugar e momento no qual as pessoas se reúnem com um sentimento cândido voltado para a busca da transcendência, é no mínimo uma atitude covarde e desrespeitosa por parte de quaisquer pastores ou líderes subordinados, além de ser uma que fere a legitimidade do culto, que é totalmente Teocêntrico, o fazendo passar a ser herético por desvio de foco. A legislação é clara: segundo a Lei 9.504/97 e de acordo com o Artigo 13, da Resolução 22.718/2008, do Tribunal Superior Eleitoral, fica proibida toda e qualquer propaganda eleitoral dentro de templo.

Art. 13. Nos bens cujo uso dependa de cessão ou permissão do poder público, ou que a ele pertençam, e nos de uso comum, inclusive postes de iluminação pública e sinalização de tráfego, viadutos, passarelas, pontes, paradas de ônibus e outros equipamentos urbanos, é vedada a veiculação de propaganda de qualquer natureza, inclusive pichação, inscrição a tinta, fixação de placas, estandartes, faixas e assemelhados (Lei nº 9.504/97, art. 37, caput).

Os batistas consideram como inalienável a liberdade de consciência. Cada pessoa é competente e responsável perante Deus, nas próprias decisões e questões morais e religiosas. A Bíblia revela que cada ser humano é criado à imagem de Deus, é único, precioso e insubstituível. Criado ser racional, cada pessoa é moralmente responsável perante Deus e o próximo.

O pastor, na qualidade de cidadão, pode e deve exercer a sua cidadania normalmente com deveres e direitos conscientes e livres. Mas, a pretensão de tentar manipular o povo de Deus sonegando o tempo do culto para defender politicos não é somente crime, mas se torna uma atitude insana e diabólica.

E disse-lhes: ‘A minha casa será chamada casa de oração.’

Pastor Fábio Feito está Presidente da Convenção Batista Nacional da Paraíba”

Textos de Mirla Regina da Silva Cutrim (Juíza de Direito do Terceiro Juizado Especial Cível) e Anderson Soares

saiu; lauroemfoco

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